quinta-feira, 27 de maio de 2010

Um canteiro.

Quem sabe um dia um milagre me leve a me tornar íntima das plantas. E me dê um fim de vida com a pá no bolso, de olho nas folhas secas e ervas daninhas. As mãos calejadas sujas de terra, a roupa surrada e macia, o rosto enrugado entretido pelo prazer. E a corcunda a olhar para baixo em busca do que cresce, contemplando o passado-futuro. Terra, terra e Terra. Finalmente amiga da vida. E, como aquela minha querida, uma morte plena e repente pra virar um bom adubo. Amém.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Um sopro.

A palavra insinuar veste um vestido. Leve e transparente. Nada afirma, insinua. Curvas sinuosas por baixo do vestido. Vestidos dão asas à imaginação. São eles as asas. Vestidos vestem. Vestes. Vento no vestido. Vestidos voltam no tempo, velhos tempos do vestido. Vestidos, volta, saia rodada. Vento por baixo da saia do vestido. Vestidos mudam de forma, revelando, não as formas, gordas ou magras, mulheres. Vestidos deixam respirar. Insinuam sinuosas curvas, perigo adiante. Suspiros. Vestidos vestem despindo. Vestidos são a minha forma de me vestir de vento.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

O ponto.

Venho de um mar revolto que não me dava descanso, um gosto de sal na garganta e uma sede, em meio a tanta água. Venho cansada da luta. E a minha sede era de água e paz.

Eu não procurava um pouso porque já tinha o meu próprio – que pode não ser macio nem mágico, mas tem o meu cheiro. Eu procurava o que não sei. Procurava parar de procurar. E já vinha desacelerando a busca, numa desistência doce.

Era a paz que eu procurava. A paz que me sorri bem puro. A paz que não é tédio. Que dá colo pra descansar, mas também é capaz de surpreender e fazer o coração bater forte, a circulação aumentar, o corpo se sentir vivo. A paz que atormenta. Paz que é um ponto.

Que é chegar em casa sorrindo. Uma insônia boa. Certeza que não mata. Saudade que revela. Que é quando a imperfeição encontra lugar confortável em nós. É sentir no outro uma semelhança macia. Saber um pouco do que vai no outro, sem saber quem é o outro.

Estou apaixonada por uma tempestade suave em mim.